Educar para Sentir-Pensar: uma pedagogia da inteireza
- Manifesto Tantra
- 7 de jun.
- 2 min de leitura
Em tempos de fragmentação do saber e cisão entre razão e corpo, recuperar o sentir como forma de pensar é um gesto profundamente político. Aprender a sentir não é apenas desenvolver competências emocionais: é reconectar-se com uma sabedoria originária, anterior à clivagem cartesiana entre mente e corpo, razão e afeto. É recuperar o laço vital entre emoção, cognição e ação, assumindo a complexidade da existência como um campo vibrátil de forças, afetos e significações.
O filósofo Spinoza já afirmava:
“O corpo humano pode fazer muitas coisas das quais a alma não tem a menor ideia”.
Em sintonia com esse princípio, Humberto Maturana nos lembra que toda ação é precedida por uma emoção — e que a emoção não é apenas um estado interno, mas um modo de estar-no-mundo, uma forma de se relacionar com o outro e com a realidade. Pensar, sentir e agir não são compartimentos estanques, mas dimensões entrelaçadas da experiência.
Do ponto de vista biológico e existencial, a emoção é o campo onde se articula o gesto, a palavra e a consciência. Ao contrário do que nos ensinou a tradição racionalista, não é a razão que move o mundo, mas o desejo, o afeto, a pulsação vital que nos atravessa. O pensar se dá no corpo, se organiza nos afetos, e ganha direção nas emoções que o sustentam. Daí a urgência de uma educação que não se limite ao ensino de conteúdos, mas que cultive atmosferas afetivas, ambientes de escuta, confiança e presença.
Educar para o sentir-pensar é, antes de tudo, criar campos relacionais onde o saber floresce como experiência encarnada. Significa abandonar o modelo bancário da educação, denunciado por Paulo Freire, e investir em espaços de convivência que respeitem o tempo, o ritmo e a singularidade de cada corpo. É transformar a sala de aula — e qualquer espaço formativo — em território de acolhimento, de legitimação da diferença, de partilha afetiva.
As emoções são moldadas pelas circunstâncias que nos atravessam: ambientes autoritários geram medo, retração, bloqueio; espaços amorosos e cooperativos abrem o fluxo do desejo, estimulam a criatividade, ativam o prazer de aprender. Um ambiente de aprendizagem é, portanto, um ecossistema afetivo que modela o próprio modo de conhecer. Educar é cuidar do campo energético onde o saber germina — é perceber que o conteúdo só frutifica quando há clima de escuta, reconhecimento e alegria.
Educar para o sentir-pensar é cultivar uma pedagogia da inteireza: formar sujeitos éticos, sensíveis, capazes de escutar o corpo, atravessar os afetos e transformar a experiência em conhecimento e ação. É um convite a nos reeducarmos: a equilibrar o corpo, libertar a mente e abrir o coração. A criar novas formas de vida onde o saber não seja uma técnica de controle, mas uma prática de liberdade.
Porque toda verdadeira educação é também uma forma de libertação — e todo pensamento que não passa pelo corpo é pensamento inacabado.
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